O que você vê?
Na minha opinião, enxergar ou simplesmente olhar algo são coisas completamente diferentes. Pois com exceção dos 39 milhões de pessoas com deficiência visual existentes no planeta, os demais tem o privilégio de olhar as coisas ao seu redor. Mas isso não quer dizer que esses enxerguem a natureza do que acontece no decorrer da vida. E nisso reside um tremendo desperdício.
A visão compõe um dos nossos cinco sentidos (visão, audição, olfato, paladar e tato), que nada mais são do que canais, através dos quais se pode perceber o mundo.
Os olhos constituem o principal órgão da visão. O portal através do qual as imagens adentram nossa mente, para que posteriormente sejam processadas pelo nosso cérebro. E esse processamento nada mais é do que uma interpretação, feita pelo nosso modelo mental, daquilo que estamos vendo. E é aí que as imagens ganham significado, de acordo com nosso "jeito de ver o mundo".
Você já deve ter ouvido falar na tal história do "copo meio cheio ou meio vazio", não é? Observe a imagem acima e me diga o que vê? Um copo meio vazio? Ou um copo meio cheio? Depende. Qualquer que tenha sido a sua escolha, dentre essas duas alternativas, ela estará certa. Afinal, o copo está com água até a metade, portanto você pode interpretar que o mesmo está meio cheio de água, ou que está meio vazio de água. Isso vai depender do seu modelo mental, ou seja, de como você está programado a enxergar a vida. Existirão também aqueles que dirão que o copo está cheio: metade com água e metade com ar. Mas esse modelo mental, estilo Pollyanna*, na maioria das vezes, é só usado em tom de ironia, portanto, por hora, iremos deixa-lo aqui quietinho, ok?
O tal modelo mental, a que me refiro, é uma espécie de padrão de conduta própria que estabelecemos de acordo com o que somos ensinados por nossos criadores, educadores, e estímulos externos, até que nossa personalidade esteja formada. A partir daí passamos a operar de acordo com ele ao longo da vida. Numa espécie de modo automático.
Caso você dirija, deve se lembrar de quando aprendeu a guiar um carro. Tudo era complexo demais, pois precisa se lembrar de fazer inúmeras coisas ao mesmo tempo. Como era difícil soltar o pedal da embreagem devagar, até encontrar o ponto certo de tirar o outro pé do freio e apertar o acelerador (de forma adequada). Quantas e quantas vezes apaguei o carro sem conseguir andar um milímetro sequer. Ou arrancar aos solavancos então? Sem falar em passar as marchas. Aquilo exigia praticamente uma formula decorada. Mas nada se comparava ao terror de arrancar "na lomba"! kkkk. Meu terror particular à vinte anos atrás.
Agora, passados tantos anos daquele início mecânico, me pego dirigindo sem pensar em absolutamente nada disso. Arrancar, trocar marchas, subir lombas, estacionar (aí o bicho pega as vezes, não vou mentir, kkk), são ações automáticas. Não só pra mim, mas para a maioria absolutas dos motoristas regulares, dirigir "está no sangue".
Mas esse papo de dirigir é só para ilustrar como a repetição pode tornar as coisas banais. Às vezes isso é bom, como no caso de poder dirigir sem ter que ficar pensando o tempo todo no que deve ser feito segundo após segundo, ou até mesmo quando comemos e não precisamos pensar ao levar o alimento à boca e mastiga-lo. O problema é quando o aprendizado acaba por banalizar momentos que não deveriam passar em branco, ou distorcer, de forma negativa, a percepção dessas ocasiões.
Ultimamente tenho postado nas redes sociais, algumas fotos de um projeto chamado "antes de morrer quero...". Ele foi inspirado numa iniciativa que nasceu em Nova Orleães, “Before I Die”, onde a artista e bolseira da TED, Candy Chang, fez de uma casa abandonada um gigante quadro preto para que os vizinhos completassem, com giz, a frase: “Antes de morrer, quero…”. As respostas foram surpreendentes. Depois o projeto se espalhou por diversas cidades do mundo, seguindo o mesmo desafio.
A que me chamou mais atenção foi a campanha do Centro Comunitário da Gafanha do Carmo, em Aveiro (Portugal), que tem realizado sonhos de um grupo de vinte e quatro idosos. Eles postaram fotos dos idosos segurando pequenos quadros com seus sonhos escritos à giz. Em comum todos tem a simplicidade e a emoção. Dentre eles abaixo seguem dois dos que mais me tocaram.
A senhora segura seu quadro, onde está escrito seu maior desejo antes de morrer: "voltar a ver". Ela sequer especifica o que ela gostaria de ver. Só ver. Ela faz parte das 39 milhões de pessoas, no planeta, que não podem ver. Enquanto o restante de nós que pertencemos aos 7,9 bilhões que podem enxergar, muitas vezes, por escolha própria, não vemos. Ou talvez até enxerguemos, mas, em função do nosso modelo mental, insistimos em ver o copo meio vazio.
Se essa senhora pudesse voltar a ver, será que ela enxergaria o copo meio cheio ou meio vazio? O mundo seria mais colorido para ela do que é para nós?
E a senhora sentada na cadeira de rodas que segura o quadro com os dizeres "quero voltar a viver"? O que será que ela quis dizer com isso? Afinal ela ainda tem batimentos cardíacos e sinais cerebrais. Qualquer médico poderia assegurar que ela ainda vive. Então por que ela deseja VOLTAR à viver?
Essa é a pergunta que vai ficar aqui. Pra você que provavelmente tem mais tempo que ela: você está vivendo HOJE? ou será que está só dirigindo sua vida no modo automático. você enxerga a vida ou simplesmente vê ela passar?
#sejasuamaiorprioridade #antesdemorrereuquero #saiadoautomatico
*Pollyanna: livro de Eleonor Porter que conta história de uma menina de 11 anos, órfã de pai e mãe, que extrai algo de bom e positivo em tudo (jogo do contente), mesmo nas coisas aparentemente mais desagradáveis.
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